Camila Fernandes estudante de jornalismo |
Após a Guerra de Troía, Ulísses contou com
a ajuda de deuses, ninfas e oráculos para conseguir retornar à sua terra natal,
Ítaca. Na minha odisséia, eu também tenho contado com seres dotados de poderes
especiais, que me norteiam e me ajudam a enfrentar as tempestades e cíclopes da
vida moderna.
Depois de alguns revezes na vida e na
família, percebi como é importante ter amigos. Em tempos difíceis, eles nos
fazem lembrar de quem somos. Ficamos inebriados com nossos problemas, padecendo
do mal das interrogações infinitas, até que um amigo chega e diz: "Assisti
um filme que é a tua cara!". Uma frase simples como esta parece que nos
desperta de um sono profundo e a gente fica a se perguntar: "Como assim, a
minha cara? Do que é que eu gosto mesmo? Quem sou eu?". E assim, a gente vai
retornando para dentro de si.
Os amigos conhecem nossa história e nos
tiram do esquecimento de nós mesmos. Eles são uma espécie de HD externo
portátil e preservam nossas memórias de um jeito bem mais seguro que nossos
próprios cérebros - cheios de complexos, sabotagens e conceitos turvos.
Em uma de minhas fases “deprê”, eu disse
para um amigo que só queria encontrá-lo quando estivesse bem. Pura ilusão!
Evitando a companhia das pessoas que nos querem bem e nos fazem bem, nossas
“crises homéricas” demoram bem mais a passar.
Tristes, eufóricos, coléricos,
decepcionados. Somos o que podemos ser, e isso muda o tempo inteiro. É bobeira
não usufruir das amizades, principalmente nos momentos de dor.
Nossos terapeutas do dia-a-dia conhecem o
melhor e o pior da gente e nos amam mesmo assim. Eles sabem que você adora
pizza de alici, macadâmias cristalizadas e um vinho siciliano difícil de
encontrar. Sabem que você odeia best-sellers porque você diz detestar tudo que
é comum, mas não despensa uma farofa e uma cerveja gelada.
São testemunhas de que você aprecia Bach,
Mozart, Umberto Eco, cinema franco-belga e outras “cultialidades”, mas sabem
que o que levanta mesmo o seu astral é uma boa batucada. É paradoxal, mas eles
entendem. Até porque, eles também são assim. Quando o assunto é amizade, os
esquisitinhos sempre acabam se encontrando.
Eu só cheguei até aqui porque tive amigos
que me mostraram o caminho de casa, minha casa interior, como Ulísses
retornando à Ítaca. Meus mapas, meus oráculos, meus amigos: meus pedaços fora
de mim.
Camila
Fernandes
Twitter: @camilabibia
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