24 de dezembro de 2012

[Devocional] Sem os amigos eu ainda estaria em Tróia

Camila Fernandes
estudante de jornalismo

Após a Guerra de Troía, Ulísses contou com a ajuda de deuses, ninfas e oráculos para conseguir retornar à sua terra natal, Ítaca. Na minha odisséia, eu também tenho contado com seres dotados de poderes especiais, que me norteiam e me ajudam a enfrentar as tempestades e cíclopes da vida moderna.

Depois de alguns revezes na vida e na família, percebi como é importante ter amigos. Em tempos difíceis, eles nos fazem lembrar de quem somos. Ficamos inebriados com nossos problemas, padecendo do mal das interrogações infinitas, até que um amigo chega e diz: "Assisti um filme que é a tua cara!". Uma frase simples como esta parece que nos desperta de um sono profundo e a gente fica a se perguntar: "Como assim, a minha cara? Do que é que eu gosto mesmo? Quem sou eu?". E assim, a gente vai retornando para dentro de si.

Os amigos conhecem nossa história e nos tiram do esquecimento de nós mesmos. Eles são uma espécie de HD externo portátil e preservam nossas memórias de um jeito bem mais seguro que nossos próprios cérebros - cheios de complexos, sabotagens e conceitos turvos.

Em uma de minhas fases “deprê”, eu disse para um amigo que só queria encontrá-lo quando estivesse bem. Pura ilusão! Evitando a companhia das pessoas que nos querem bem e nos fazem bem, nossas “crises homéricas” demoram bem mais a passar.

Tristes, eufóricos, coléricos, decepcionados. Somos o que podemos ser, e isso muda o tempo inteiro. É bobeira não usufruir das amizades, principalmente nos momentos de dor.

Nossos terapeutas do dia-a-dia conhecem o melhor e o pior da gente e nos amam mesmo assim. Eles sabem que você adora pizza de alici, macadâmias cristalizadas e um vinho siciliano difícil de encontrar. Sabem que você odeia best-sellers porque você diz detestar tudo que é comum, mas não despensa uma farofa e uma cerveja gelada.

São testemunhas de que você aprecia Bach, Mozart, Umberto Eco, cinema franco-belga e outras “cultialidades”, mas sabem que o que levanta mesmo o seu astral é uma boa batucada. É paradoxal, mas eles entendem. Até porque, eles também são assim. Quando o assunto é amizade, os esquisitinhos sempre acabam se encontrando.

Eu só cheguei até aqui porque tive amigos que me mostraram o caminho de casa, minha casa interior, como Ulísses retornando à Ítaca. Meus mapas, meus oráculos, meus amigos: meus pedaços fora de mim.

Camila Fernandes
Twitter: @camilabibia

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